Foto: Pedro França/Agência Senado
O senador licenciado Chico Rodrigues (DEM-RR) 21 de outubro de 2020 | 21:15

Empresa ligada a caso Chico Rodrigues vendeu máscaras com preço 26 vezes maior

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Uma empresa apontada pela Polícia Federal como próxima ao senador Chico Rodrigues (DEM-RR) e suspeita de superfaturamento em contratos destinados ao combate à pandemia covid-19 vendeu, ao governo de Roraima, máscaras de proteção a um preço 26 vezes mais caro do que o custo original. Chico Rodrigues foi afastado do Senado na quinta-feira passada, um dia após ter sido flagrado com R$ 33 mil na cueca.

Uma nota fiscal emitida em 8 de abril pela Haiplan Construções Comercio e Serviço LTDA mostra que a empresa cobrou R$ 879.219,00 do governo por 16.434 máscaras. Cada unidade saiu por R$ 53,50. Dias antes, em 17 de março, porém, a Haiplan havia pago apenas R$ 1,45 pela unidade das máscaras. O item foi adquirido de uma empresa sediada no Rio Grande do Norte, com um número de máscaras semelhante, com ao custo total de R$ 26.710,00.

A Haiplan é de propriedade de Júlio Ferreira Rodrigues, casado com a empresária Gilce Pinto. Mensagens obtidas pela Polícia Federal, de uma conversa entre Chico Rodrigues e um então servidor da Secretaria Estadual de Saúde, Francisvaldo de Melo Paixão, mostram o senador fazendo perguntas sobre um pagamento realizado a uma pessoa denominada Gilce.

Em fevereiro, Chico chegou a perguntar a Francisvaldo: “Você adiantou o pgto da Gilce/18—serviços?”. O funcionário diz que sim, está providenciando pagamento de R$ 2,6 milhões. “Tudo indica que o Senador estaria cobrando o pagamento da empresa HAIPLAN CONSTRUCOES COMERCIO E SERVICOS LTDA, CNPJ 03.094.036/0001-70”, diz a PF, no inquérito que apura as supostas irregularidades.

“A forma com que o Senador cobrava o pagamento da empresa Haiplan em suas conversas com Francisvaldo indicam que o parlamentar estaria atendendo não apenas aos interesses do estado de Roraima, mas também aos seus próprios. Com base no diálogo entre Francisvaldo e o Senador, há fortes indícios de que este parlamentar teria grande influência no Governo de Roraima”, diz a Polícia Federal.

Francisvaldo de Melo Paixão é o delator do esquema de desvios na Saúde em Roraima, com base em dinheiro das emendas parlamentares que deveria ser destinado ao combate da pandemia de covid-19. Apesar de ser funcionário do governo, ele chega a chamar Chico Rodrigues de “chefe” em uma conversa. Na ocasião, ele pedia ajuda a Chico Rodrigues para conseguir um avião para transportar equipamentos médicos. Dois dias depois, o senador encaminhou um e-mail ao Ministério da Defesa pedindo autorização para transportar equipamento médico de São Paulo a Roraima. O ministério disse ao Estadão que o pedido não foi atendido, mas não explicou a razão.

A designação de ‘chefe’ volta a aparecer em mensagem posterior. Desta vez, em uma troca de mensagens entre a empresária Gilce e Francisvaldo. “Com base no contexto deste diálogo, analisado em conjunto com todo o material já exposto, supõe-se que o ‘chefe’ mencionado por GILCE trata-se do Senador Chico Rodrigues”, diz a PF.

Em outros diálogos, Francisvaldo e Gilce aparentemente chegam a ajustar potenciais preços em produtos a serem adquiridos pela Administração Pública. A Polícia Federal diz que o conjunto de mensagens analisadas representa ‘indícios de favorecimento por parte de Francisvaldo em relação à Haiplan, bem como, em determinados momentos, reforça a hipótese de envolvimento do Senador Chico Rodrigues com esta empresa’.

Policiais também trabalham com a possibilidade de um sobrinho do senador, Léo Rodrigues, ex-vereador em Boa Vista (RR), ter agido em nome da Haiplan, de acordo com conteúdo extraído de conversas entre Léo e Francisvaldo.

A Haiplan não é a única empresa que teria sido favorecida no esquema da saúde, de acordo com a PF. Investigadores encontraram indícios de direcionamento na dispensa de licitação realizada para a compra de testes de kit rápido para detecção da covid-19 para três empresas — dentre elas, a Quantum Empreendimentos. A Controladoria-Geral da União (CGU) suspeita de sobrepreço no valor de R$ 956,8 mil em um contrato para o fornecimento de kits de teste rápido.

Após ser afastado por decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, Chico Rodrigues pediu afastamento por 121 dias, abrindo caminho para que seu suplente, seu filho Pedro Arthur Rodrigues, assuma em seu lugar no período.

Diagrama

A teia de relacionamentos entre as pessoas citadas na investigação foi apresentada em um diagrama elaborado pela Polícia Federal, juntado ao inquérito no Supremo Tribunal Federal. “As informações aqui colhidas sugerem que o senador estaria utilizando Leonardo Rodrigues Moreira e Gilce de Oliveira Pinto como seus operadores na empresa Haiplan, e Jean Frank Padilha Lobato na empresa Quantum”, afirmou a PF.

Jean Frank Lobato é um ex-deputado estadual de Roraima apontado pela PF como “operador” de Chico Rodrigues em negócios no Estado. Ele é concunhado do dono da Quantum Empreendimentos, Roger Henrique Pimentel, e é casado com uma assessora do senador, Sâmara de Araújo Xaud. É essa a empresa que seria beneficiada, caso o Ministério da Defesa concordasse em ceder um voo da FAB para transporte de equipamento médico, segundo a PF. Ao menos parte do equipamento pertenceria a Quantum.

Algumas mensagens mostram Jean tratando com Francisvaldo sobre contratos da Quantum. Para a PF, o ex-deputado estadual é próximo ao senador Chico Rodrigues. Essa ligação teria sido citada por testemunhas de outro caso em que Jean Lobato é investigado, que não trata de desvios na Saúde. Além disso, a esposa de Jean é a assessora do senador, Sâmara Xaud, com salário de R$ 13,4 mil.

A investigação da Polícia Federal também aponta que um assessor parlamentar do senador, chamado Marcos Aurélio de Brito Duarte, com salário de R$ 6,7 mil, também conversa com Francisvaldo sobre emendas parlamentares. Os dois assessores, porém, não figuram como investigados no caso.

Estadão Conteúdo
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