Foto: Marcos Corrêa/PR
Dívida recorde e pressão no teto comprometem ações para controle dos impactos da pandemia na saúde e na economia 04 de janeiro de 2021 | 06:57

Crise fiscal e conflito entre cortar e gastar são desafios em 2021

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Em um governo com divergências internas, que coloca em lados opostos a equipe econômica e as alas política e militar, quando o assunto é o tamanho do gasto público, 2021 promete ser um ano de disputa pelos limitados recursos do Tesouro.

Com um Orçamento de cerca de R$ 1,5 trilhão, o governo terá liberdade para manejar menos de R$ 100 bilhões. São os chamados gastos discricionários, que incluem investimentos e despesas para a manutenção da máquina pública.

O restante são verbas carimbadas, como os recursos voltados aos pagamentos de salários de servidores públicos e benefícios previdenciários.

O Brasil não gera superávit fiscal desde 2014, o que significa que o governo vem gastando mais do que arrecada (já desconsiderando a despesa com os juros da dívida pública).

O buraco nas contas vai atingir um patamar sem precedentes em 2020 devido à pandemia. Só com medidas emergenciais para o combate à crise sanitária, o gasto ficou em torno de R$ 600 bilhões, o que deve levar o resultado primário do ano a um déficit de R$ 844 bilhões, segundo a estimativa oficial.

E os rombos continuam. Para 2021, o governo estabeleceu uma meta de déficit de R$ 247,1 bilhões para as contas do governo federal. Se confirmado, esse valor será o segundo pior já registrado pelo Tesouro, perdendo apenas para o atípico ano de 2020.

A forte expansão de gastos para mitigar os efeitos da pandemia levou a uma disparada no endividamento público, antes já elevado e acima do de países como a Alemanha. A dívida bruta do governo, que encerrou 2019 em 74,3% do PIB, deve fechar 2020 em 91% do PIB, segundo estimativa oficial.

A dívida do governo passou de R$ 4,5 trilhões em 2020, com prazos mais curtos de pagamento e juros maiores, e a tendência é continuar subindo pelo menos até 2030, se o governo não adotar medidas de restrição de gastos, ampliação da arrecadação ou ações extraordinárias, como a privatização de estatais e venda de outros ativos.

Ainda sem controle da pandemia e sem vacinas disponíveis para os brasileiros, a virada de 2020 para 2021 traz de volta as regras fiscais, suspensas no período de calamidade pública (encerrado no dia 31).

Com isso, o governo terá de respeitar novamente a meta para o resultado primário e o limite imposto pelo teto de gastos, regra que impede que as despesas públicas cresçam mais do que a inflação.

Embora membros da equipe econômica afirmem que o governo conseguirá passar por 2021 sem descumprir a norma, especialistas apontam que há risco de rompimento do teto.

Por isso, o Ministério da Economia quer a retomada da agenda de mudanças estruturantes e medidas de ajuste fiscal, como a reforma administrativa (que diminui gastos com servidores), a reforma tributária (que simplificaria normas e aumentaria a competitividade) e a proposta do pacto federativo (que revê despesas).

Mas o ministro Paulo Guedes (Economia) não obtém consenso para as medidas nem mesmo entre os colegas de governo. Membros das alas política e militar defendem uma maior liberdade para ampliar despesas em obras públicas sob o argumento de que isso poderia estimular a atividade econômica.

Também há pressão entre especialistas e parlamentares para que o governo amplie gastos com saúde para combater a pandemia e reforce programas de assistência social para amparar pessoas que ficaram sem emprego e perderam renda na crise sanitária.

Na visão dos analistas, o ajuste fica ainda mais comprometido sem o presidente Jair Bolsonaro liderar a discussão pelas mudanças.

Folha de S. Paulo
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