Lucas Faillace Castelo Branco

Direito

Lucas Faillace Castelo Branco é advogado, mestre em Direito (LLM) pela King’s College London (KCL), Universidade de Londres, e mestre em Contabilidade pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). É ainda especialista em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET) e em Direito empresarial (LLM) pela FGV-Rio. É diretor financeiro do Instituto dos Advogados da Bahia (IAB) e sócio de Castelo e Dourado Advogados.

O Efeito Streisand

Recentemente, noticiou-se na imprensa a tentativa de censura pelo Prefeito do Rio de Janeiro a revistas em quadrinhos, as quais seriam vendidas na Bienal do Livro no Rio, contendo a imagem de dois homens se beijando.

A justificativa foi a de que a revista, imprópria para menores, deveria conter a advertência de faixa etária. Após batalhas judiciais, dois ministros do STF entenderam ter havido censura.

O caso ganhou ampla repercussão no noticiário nacional, com manifestações de artistas e jornalistas contrariamente à atitude do prefeito. Um jornal de circulação nacional estampou em sua capa o desenho que motivou a censura. A imagem, enfim, espalhou-se rapidamente em diversos meios.

Com o fácil acesso à internet e à televisão, é difícil que aqueles a quem a censura visava proteger não tivessem visto a imagem do beijo. A ação do prefeito despertou a curiosidade de todos.

O fato ocorrido ilustra bem o chamado Efeito Streisand. Ele se verifica quando a ocultação de uma informação/fato acaba atraindo a atenção ampla do público, pela curiosidade despertada, ganhando, em tese, repercussão tal que não ocorreria sem a tentativa de ocultação. Em outras palavras, é uma espécie de “tiro que sai pela culatra” ou de o “feitiço que vira contra o feiticeiro”.

O termo foi cunhado por Mike Masnick em 2003, por ocasião de uma ação judicial movida pela cantora Barbara Streisand com o fim de retirar, de um site da internet, uma foto aérea de sua mansão na Califórnia feita pelo fotógrafo Kenneth Adelman, sob a alegação de privacidade. Os acessos às fotos aumentaram vertiginosamente.

O fenômeno não é incomum e é potencializado pela internet e seus buscadores. Por vezes a curiosidade do público é despertada por imagens de pessoas públicas em situações íntimas, cuja investida de ocultação por elas é noticiada pela mídia.

Na Inglaterra, há até uma medida judicial que visa impedir o Efeito Streisand em certas circunstâncias. Quem ingressa com uma ação pleiteando danos pode requerer ao Judiciário não só o segredo de justiça, isto é, que não se divulgue as informações contidas no processo, como também a própria divulgação de que o processo e o sigilo existem, sob pena de crime de desobediência (“contempt of court”).

Isso evita que os olhos do público (e da mídia, em especial) sejam atraídos pela curiosidade do que consta no processo em que pese o segredo. Em outras palavras, evita-se o jornalismo investigativo, tabloides e a devassa da vida privada do requerente pelos curiosos de plantão.

Um pouco refinada para a nossa prática judicial, é verdade, em que predomina o segredo de justiça à brasileira: os vazamentos ocorrem à vontade sem a identificação e punição do violador. E ele pode beirar o cúmulo do absurdo. E digo por experiência própria.

Já vi, em mais de um processo em segredo justiça, a publicação sair no Diário Oficial com as iniciais das partes no campo próprio de sua identificação, porém, em razão da veiculação do inteiro teor da decisão, com os nomes completos delas no próprio ato judicial, e não suas iniciais.

O Efeito Streisand revela o descontrole das informações que caem em domínio público, potencializado pela tentativa de sua remoção – o que atrai a curiosidade do público – e pelo acesso à internet. A divulgação dessas informações ora se considera legítima, quando protegida pela liberdade de expressão, ora ilegítima, quando expõe a privacidade e a intimidade.

A Inglaterra possui medidas judiciais eficazes para coibir a segunda hipótese. O Brasil, por outro lado, engatinha.

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