21 dezembro 2024
O mercado financeiro brasileiro ainda está longe de ter um perfil engajado com a sustentabilidade. Apesar da onda ESG (boas práticas ambientais, sociais e de governança, na sigla em inglês), instituições do setor —como bancos, corretoras e gestoras de recursos— são consideradas distantes ou iniciantes nessa jornada.
É o que mostra um levantamento feito pela Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) em parceria com o Datafolha e a consultoria Na Rua.
Com o objetivo de entender em qual estágio o mercado brasileiro está na agenda sustentável, a entidade ouviu 265 empresas entre janeiro e julho de 2021.
Cinco perfis de instituições financeiras foram identificados: desconfiado, distante, iniciado, emergente e avançado.
Segundo a pesquisa, o perfil distante lidera o ranking, com 35% da amostra. As companhias enquadradas nessa categoria são aquelas com baixa implementação de práticas sustentáveis e uma visão simplificada sobre o tema —entendendo-o como um compromisso exclusivo com o meio ambiente. ?
A maioria das empresas nesse perfil são gestoras de recursos (81%), com média de R$ 2,3 bilhões em ativos sob gestão. Além disso, metade das distribuidoras e corretoras que participaram da pesquisa foram consideradas distantes em relação à sustentabilidade.
O segundo perfil predominante foi o iniciado. Quase um terço das instituições financeiras (32,1%) estão nessa categoria, que engloba as companhias com iniciativas mais simples, como uso de lâmpadas sustentáveis e coleta seletiva do lixo.
As práticas, contudo, ficam restritas ao ambiente interno do escritório e não são consideradas na hora de fazer negócios. De acordo com o levantamento, uma parcela significativa dos bancos (40%) encontra-se nesse perfil.
Juntas, as instituições financeiras consideradas distantes ou iniciadas representam 67,1% da amostra.
Para Carlos Takahashi, vice-presidente da Anbima, é possível olhar os resultados por uma perspectiva otimista, considerando que, há alguns anos, o mercado brasileiro caminhava ainda mais devagar em relação ao ESG.
“É claro que há muita coisa para acontecer ainda. Quando vemos o agrupamento dos distantes, por exemplo, ele está mais ligado a questões ambientais e tem uma visão elementar, mas já começa a ter uma sensibilidade maior em relação ao assunto”, afirma.
O mesmo vale para as instituições iniciadas. “É aquela ideia de fazer o dever de casa. Sob o ponto de vista de princípios, é algo interessante: eu preciso ter minhas [próprias] atitudes antes de colocar no negócio”, diz.
O levantamento também mapeou as empresas emergentes, ou seja, que estão começando a implementar práticas ESG de forma mais robusta. Elas representam 21,5% do mercado brasileiro.
O comportamento desse perfil, segundo a pesquisa, indica um processo de transição sustentável. São instituições que já entendem o tema em suas dimensões ambiental, social e de governança, mas ainda têm dificuldades em colocar isso na prática do negócio.
Já os extremos são minoria na pesquisa. Apenas 6,8% das instituições financeiras são engajadas e veem a sustentabilidade como parte da estratégia de negócio.
No polo oposto, o perfil desconfiado é o que possui menor presença, correspondendo a 4,2% do mercado financeiro brasileiro. Estão nessa categoria empresas que veem a sustentabilidade com ceticismo e potencial entrave para o desenvolvimento do negócio.
Takahashi diz não se surpreender com a existência de uma parcela de desconfiados. “Eu, pessoalmente, achei que o [perfil] desconfiado ia ter um número maior, porque muitas empresas pensam ‘poxa, eu incorporo os fatores ESG, mas como fica o meu dever com o investidor em entregar o retorno que ele espera?'”
Na visão dele, a perspectiva é de que a sustentabilidade cresça de forma acelerada no setor. Primeiro, porque os temas socioambientais vêm ganhando relevância no mundo corporativo, mas também em função das agendas regulatórias empenhadas por entidades financeiras.
“Vemos o Banco Central bastante envolvido com o assunto, o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], a CVM [Comissão de Valores Mobiliários]… Enfim, temos o engajamento dos stakeholders de mercado e, na outra ponta, o investidor olhando para o assunto cada vez mais”, afirma.
“Ainda que o Brasil não tenha a quantidade de produtos que verificamos em mercados como Europa e Estados Unidos, nem o mesmo volume de recursos indo para investimentos sustentáveis, esse fenômeno também vem acontecendo aqui. Então, sem dúvida nenhuma, veremos o tema ganhar mais relevância”, acrescenta.
Thiago Bethônico / Folha de São Paulo