Enviado de Trump e Amorim se reuniram em NY antes do encontro com Lula na ONU
Por Felipe Frazão/Estadão
10/10/2025 às 21:16
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil/Arquivo

Enviado especial para Missões Especiais da Casa Branca, Richard Grenell, reuniu-se em Nova York com o ex-chanceler Celso Amorim na véspera do primeiro encontro entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump, na Assembleia Geral da ONU.
O contato azeitou ainda mais a percepção, de ambos os lados, de que Lula e Trump poderiam destravar a relação até então bloqueada, na manhã seguinte, no dia 23, quando dividiriam a mesma sala reservada no backstage da ONU.
“Grenell é um cara muito pragmático”, disse Celso Amorim ao jornal O Estado de São Paulo, sem comentar mais detalhes.
Até agora mantido em sigilo, o encontro de Grenell e Amorim no dia 22 de setembro, na Big Apple, faz parte da série de reuniões secretas entre autoridades dos governos brasileiro e americano, revelada pelo Estadão. Ele marca também a entrada de Amorim nas articulações.
A primeira interação de Lula e Trump não foi tão espontânea como ambos relataram. Houve um discreto trabalho diplomático que envolveu ainda o vice-presidente Geraldo Alckmin e o embaixador Jamieson Greer, representante comercial dos EUA. Mas até o último momento, poderia não ocorrer.
A reportagem apurou ainda que houve um fator adicional. Quando o petista deixou a tribuna da ONU, depois de discursar, um segurança da equipe nacional indicou com os braços o caminho errado para Lula deixar o espaço, que seria ocupado por Trump na sequência.
O petista tomou esse rumo e acabou notando a presença do americano, que assistira na sala de chefes de Estado ao discurso dele. Então Lula acenou e foi ao encontro de Trump, acompanhado do embaixador Fernando Igreja, chefe do Cerimonial do Planalto e intérprete por 39 segundos.
Contatos secretos
A conversa, no entanto, foi o segundo contato entre eles. No dia 15 de setembro, Grenell desembarcou no Rio de Janeiro para se reunir a sós com o ministro Mauro Vieira. Eles conversaram acompanhados de poucos assessores, em um hotel na orla da Zona Sul carioca.
Antes de encontrar o chanceler pessoalmente, Grenell quis conversar com Amorim. Já em território brasileiro, ele telefonou para o mais graduado conselheiro internacional do presidente Lula. As assessorias haviam preparado a conversa. Eles trocaram os telefones pessoais com WhatsApp e combinaram o encontro em Nova York, exatamente uma semana depois.
Para o governo brasileiro, a atuação mais “pragmática” de Grenell foi fundamental para mudar a percepção do presidente americano sobre o caso brasileiro.
Um integrante do governo considera que Trump passou a ouvir “outras vozes” e começou a se convencer, ao ponto de “enquadrar” o secretário de Estado Marco Rubio, mais suscetível ao lobby bolsonarista e “linha dura” com regimes e governos de esquerda.
Trump, porém, manteve Rubio como interlocutor para o Brasil. Apesar de gerar apreensão, a decisão foi percebida no Brasil como uma escolha dentro da praxe pelo fato de ele ser o secretário de Estado e conselheiro de Segurança Nacional, posições que pressupõem mediação exterior. Ainda, como uma maneira de não “rifar” Rubio por completo. Para Amorim, Rubio é “importante” na administração de Trump para obter “equilíbrio interno” de forças e influência no Congresso americano.
Após o telefonema presidencial de segunda-feira, Rubio já conversou também por telefone na manhã desta quinta com Mauro Vieira. Segundo um relato colhido pela reportagem, eles teriam falado em espanhol - o secretário de Estado fala fluentemente o idioma por ser filho de imigrantes cubanos.
Ambos combinaram uma nova reunião presencial em Washington, desta vez oficial e com equipes. Os preparativos dão conta de que ela pode ocorrer a partir da quarta-feira da semana que vem, antes da viagem de Lula e Trump à Malásia, onde novo encontro presidencial poderia acontecer.
Ex-embaixador na Alemanha e enviado para negociações na Sérvia e no Kosovo, Grenell chegou a ser cogitado como secretário de Estado e faz parte de uma ala do governo americano que por vezes se choca com a de Marco Rubio.
Além de ter cumprido missões na América Latina, como emissário para os governos Lula e Nicolás Maduro, Grenell atualmente exerce também o cargo de diretor do The Kennedy Center.
Após a revelação do Estadão de que ele veio ao Brasil para contatos com Mauro Vieira - e, agora se sabe, com Amorim - Grenell entrou na mira da ala mais ideológica em Washington e dos bolsonaristas.
A reportagem procurou Grenell sobre seus contatos com autoridades do governo Lula, por meio da Casa Branca e do Kennedy Center, mas ainda não recebeu resposta.
