23 novembro 2024
Economista do Ministério da Economia. Mestre em Economia e Doutor em Administração Pública pela UFBA. Autor de diversos trabalhos acadêmicos e científicos, dentre eles o livro Política, Economia e Questões Raciais publicado - A Conjuntura e os Pontos Fora da Curva, 2014 a 2016 (2017) e Dialogando com Celso Furtado - Ensaios Sobre a Questão da Mão de Obra, O Subdesenvolvimento e as Desigualdades Raciais na Formação Econômica do Brasil (2019). Foi Secretário Estadual de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi) e Diretor-presidente da Companhia de Processamento de Dados do Estado da Bahia (Prodeb), Subsecretário Municipal da Secretaria da Reparação de Salvador (Semur), Pesquisador Visitante do Departamento de Planejamento Urbano da Luskin Escola de Negócios Públicos da Universidade da Califó ;rnia em Los Angeles (UCLA), Professor Visitante do Mestrado em Políticas Públicas, Gestão do Conhecimento e Desenvolvimento Regional da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Professor, Coordenador do Curso de Ciências Econômicas e de Pesquisa e Pós-Graduação do Instituto de Educação Superior Unyahna de Salvador.
A política macroeconômica é a principal política pública de qualquer país. Nenhuma nação minimamente civilizada, sob quaisquer conceitos, prescinde de um modelo geral para a gestão dos grandes agregados de sua economia como ferramenta orientativa para os agentes econômicos e atores sociais em suas decisões de curto, médio e longo prazos.
No Brasil, com a consolidação da nossa democracia partir da segunda metade da década de 1980, algumas questões passaram a ser básicas na agenda macroeconômica, conformando uma espécie de “contrato social mínimo” entre os detentores do poder e a sociedade que os elegeram. O combate sistemático a inflação, o crescimento da economia e do emprego, a melhoria constante e generalizada da qualidade de vida e a melhor distribuição da riqueza passaram a ser condições necessárias para iniciar quaisquer debates sobre o presente e o futuro do país, em termos econômicos.
A sociedade passou a exigir resultados mais concretos sobre aquilo que afeta mais diretamente a vida de seus cidadãos, independente do matiz ideológico original daqueles que por ventura estejam momentaneamente dirigindo os destinos da nação. Portanto, para além das decisões e ações governamentais, as expectativas dos agentes econômicos e atores sociais passaram a ter um peso significativo, para o sucesso ou fracasso das políticas as macroeconômicas, a partir de um conceito muito simples: confiança.
Essa é uma explicação bastante razoável para o êxito do governo Lula, no período imediatamente posterior aos oito anos do governo FHC, cuja orientação política e ideológica se diferia, em muito, daquela pregada pelo governo que o sucedeu. Sabe-se, hoje, por exemplo, que o que sustentou o governo de Fernando Henrique, apesar de todos os problemas, foi o sucesso no combate a inflação e a sensação de estabilidade macroeconômica que eles conseguiram generalizar perante a sociedade.
Por isso, a vitória de Lula em 2002, ocorre num ambiente de mudanças menos ideológicas no que diz respeito a gestão da macroeconomia e mais pautada pelas deficiências do governo do PSDB no que se refere a melhoria da qualidade de vida dos mais pobres. Esse, também, foi o principal motivo que ele conseguiu fazer sua sucessora, pois, além de manter o patamar adquirido no governo anterior no que diz respeito a estabilidade da moeda, avançou para políticas sociais e garantia de direitos, aproveitando-se de vários elementos positivos do contexto histórico, elevando, assim, as expectativas das pessoas e da sociedade para um novo patamar de bem-estar social.
Contraditoriamente, esse novo patamar foi uma benção e uma maldição para quem lhe sucedeu. Manter os padrões de bem-estar dos oito anos de governo Lula, sob uma camada preexistente de estabilidade monetária de também oito anos de governo FHC, significava quase duas décadas de uma condição econômica jamais vista no país desde o inicio de sua república e, conjunturalmente, nunca experimentado pela população. O raciocínio foi que a manutenção ou elevação do mesmo padrão médio de consumo, renda e bem-estar exigiria mudanças paradigmáticas na gestão macroeconômica e isso foi tentado com a chamada nova matriz econômica tanto criticada, hoje, por alguns.
Tudo isso caracterizou um grande diferencial, mas também um grande problema. Enquanto a gestão macroeconômica do governo Lula teve a prerrogativa de aproveitar as externalidades positivas do modelo herdado do governo FHC, a tese da nova matriz econômica tentou superar o modelo herdado, por “bypass”, introduzindo uma outra perspectiva teórica e conceitual visando iguais ou melhores resultados dos anos anteriores. No entanto, o resultado parece não estar sendo satisfatório.
Esse é um aspecto da presente crise que precisa ser melhor observado sob pena de não se conseguir compreender importantes elementos que vem fazendo dos últimos meses um grande período de desconforto generalizado em todo o país. Algo bastante parecido ocorreu no governo FHC em 1999, quando diferentemente de tudo que foi dito na campanha de 1998, a equipe econômica além de ser alterada produziu a maior desvalorização do real até hoje, gerando expectativas muito negativas sobre a economia naquele período. A crise que ora estamos passando, guardadas as devidas proporções, possuem elementos muito parecidos com a daquele momento, em especial, a reorientação da gestão da economia, pós eleições, de forma muito diferente do que foi dito que iria ser feito como elemento de diferenciação entre os projetos políticos em disputa.