Karla Borges

Economia

Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

Salvador e a decisão do STJ sobre o ITIV

A decisão proferida pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) referente ao Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos (ITIV ou ITBI) vincula a adoção de procedimento semelhante em todas as ações que tramitarem nos tribunais de justiça do país, por se tratar de recurso repetitivo: quando o órgão define uma tese que deve ser aplicada aos processos em que seja discutida idêntica questão de direito. Não seria prudente, então, que o Município de Salvador, tendo ciência de que o tribunal adota o valor da transação como base de cálculo do ITIV, passe a aceitar o valor declarado pelo contribuinte na transmissão de bens imóveis?

Seria justo o cidadão, diante desse cenário, judicializar a questão? Quem responderá pelos prejuízos causados aos adquirentes de imóveis? Quem seria compelido a reparar os danos ocorridos? Propagandas em redes sociais, contatos permanentes com associações empresariais e imobiliárias não eximem a Secretaria Municipal da Fazenda de Salvador de adotar o bom senso e seguir a legislação pátria, afinal o que a população almeja são ações efetivas para que a tese seja compreendida e aplicada.

É imperioso que a gestão fazendária se alinhe ao posicionamento do STJ, adequando o sistema de administração tributária de modo a permitir que o adquirente declare o valor da transação imobiliária e que esse seja a base de cálculo do imposto. “O lançamento do ITIV deve ocorrer por meio da declaração do contribuinte, ressalvado ao fisco o direito de revisar a quantia declarada, mediante procedimento administrativo que garanta o exercício do contraditório e da ampla defesa.”

“Em relação à possibilidade de adoção de valor venal previamente estipulado pelo fisco, o Ministro Gurgel de Faria explicou que, ao adotar esse mecanismo, a administração tributária estaria fazendo o lançamento de ofício do ITIV, vinculando-o indevidamente a critérios escolhidos de maneira unilateral – os quais apenas mostrariam um valor médio de mercado, tendo em vista que despreza as particularidades do imóvel e da transação que devem constar da declaração prestada pelo contribuinte, que possui presunção de boa-fé. Ainda de acordo com o magistrado, a adoção do valor prévio como parâmetro para a fixação da base de cálculo do ITIV resultaria na inversão do ônus da prova em desfavor do contribuinte, procedimento que viola o disposto no artigo 148 do Código Tributário Nacional (CTN).”

O ônus de provar um valor contrário ao declarado é do sujeito ativo. É o Município que deve instaurar um procedimento administrativo para contestá-lo, caso discorde. O fisco não poderia emitir a guia de pagamento do ITIV automaticamente.  Deve permitir que a emissão seja feita somente após o contribuinte informar o valor celebrado. Cabe unicamente à administração municipal verificar se o valor apontado está compatível com o de mercado.

Segundo a decisão do STJ, o ITIV comporta apenas duas modalidades de lançamento originário: por declaração, se a norma local exigir prévio exame das informações do contribuinte pela Administração para a constituição do crédito tributário, ou por homologação, se a legislação municipal disciplinar que caberá ao contribuinte apurar o valor do imposto e efetuar o seu pagamento antecipado sem prévio exame do ente tributante.

É importante ressaltar que a legislação municipal não necessita de alteração, uma vez que a Lei 7.186/06 no artigo 116 determina que a base de cálculo do imposto é o valor nas transmissões em geral, dos bens ou direitos transmitidos. “A adoção de um valor de referência pela Administração configura indevido lançamento de ofício do ITIV por mera estimativa e subverte o procedimento instituído no art. 148 do CTN, pois representa arbitramento da base de cálculo sem prévio juízo quanto à fidedignidade da declaração do sujeito passivo.” A intenção de Salvador é promover justiça fiscal ou abarrotar o poder judiciário com processos que lhe serão fatalmente prejudiciais?

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