23 dezembro 2024
Adriano de Lemos Alves Peixoto é PHD, administrador e psicólogo, mestre em Administração pela UFBA e Doutor em Psicologia pelo Instituto de Psicologia do Trabalho da Universidade de Sheffiel (Inglaterra). Atualmente é pesquisador de pós-doutorado associado ao Instituto de Psicologia da UFBA e escreve para o Política Livre às quintas-feiras.
Não tem nenhuma novidade. Os sinais e as noticias estão por todos os lugares. Basta abrir os jornais e os sites de notícias que elas logo saltam aos olhos: déficit público, contenção de gastos, dificuldade para pagamento da folha de salários, desemprego, empresas em dificuldades. Basta andar por um shopping qualquer para se ficar impressionado com a quantidade de lojas fechadas. O número de desempregados também chama atenção, doze milhões. Ainda que não exista nenhuma grande dificuldade para se compreender a atual realidade econômica, há um elemento que curiosamente (ou não …) se faz pouco presente, mesmo nos meios de comunicação que costumam ser mais críticos. Refiro-me ao lado humano da crise atual que já se arrasta por três anos, e que aponta para mais uma década perdida na economia.
Esta semana me reuni com alguns amigos que já não via há algum tempo. A conversa como não podia deixar de ser caminhou para a economia. Mas diferentemente de outras ocasiões onde reclamações genéricas se apresentavam desta vez o tema girou em torno das pessoas.
Uma desses amigos é Michel, geólogo, francês, casado com uma prima. Até uns três ou quatro anos atrás ele me falava da dificuldade de se contratar um geólogo para trabalhar em um projeto de exploração de minérios e de como as empresas buscavam estagiários no meio do curso nas escolas politécnicas. Esta semana a conversa mudou. Cuidando da implantação de uma mina no norte do país, ele me falou dos mais de oitenta currículos que recebe todo o mês de profissionais muito qualificados, de todas as idades, que estão dispostos a trabalhar por qualquer preço. Mais do que isso, de como tem sido doloroso receber a ligação de pessoas conhecidas que imploram chorando por uma oportunidade. Pessoas que perderam o emprego, que têm família para sustentar e não vêm perspectivas.
Nessa mesma conversa Guto, administrador sério que trabalha para uma das empreiteiras baianas envolvidas na lava a jato, narrou uma estória semelhante que ele ouviu quando estava com seu chefe, que foi demitido e depois recontratado por um terço do salário que originariamente recebia. O chefe recebendo ligação de profissionais com os quais já havia trabalhado e que aos prantos imploravam por uma oportunidade para voltar a trabalhar, narrando as dificuldades para pagar aluguel, mensalidade da escola dos filhos…
Desconfio que na polarização política que tomou conta do país, no embate de notas de repúdio, dos slogans e campanhas contra ou favor desta ou daquela posição política, da apresentação e da contestação de números, as pessoas são o detalhe incômodo. Pensar nas pessoas é dar um rosto à crise. E quando uma crise ganha o rosto ela invade nossas casas e nossas vidas com uma força avassaladora. E na grande maioria das famílias do país esse rosto é conhecido! É seu primo, sua irmã, seu vizinho, sua esposa, seu filho que não consegue um trabalho…Quem pagará essa conta? Quem arcará com a responsabilidade? Nessa hora só me vem à mente aquela célebre frase do camarada Mao : “Não importa a cor do gato desde que ele cace o rato”! Será que isso explica alguma coisa?